Zumbigos

Sonia Lins

Para que alguma coisa exista é preciso que você pense nela. Nunca pensei no meu umbigo, nem no seu, nem no dele. Logo, nenhum deles existia para mim. Resolvi por o meu pensamento na coletividade e era preciso um logotipo para ela. Levantando a roupa, achei o umbigo. Comecei a pensar no meu, no seu e no de nós todos. Através da superfície de cartilagem macia e morna forcei a minha cabeça até então calva de pensamentos num ato contrário ao nascimento e encontrei o cordão umbilical – rosário de nós unidos por mistérios grosso e dolorosos – e atravessei com medo de pisar em frases que o amparavam alardeando o poder curativo de suas células jovens – visto que as que não eram jovens tinham esquecido como fazê-lo. Andando segui o itinerário de um som que entrava cada vez mais dentro dos meus ouvidos. Era o grande umbigo que respirava – inflando e desinflando – esvaziando de novo e se alimentando de ar. Esse umbigo era o meu, o seu, o de todos nós – nós dados em todos nós – enlace de nós todos impossível de ser desatado – somos o nó de nós todos – nó do real – do simbólico – do imaginário – sintoma de toda a humanidade – como nos diria Lacan.

Paris, janeiro de 2002