"Resolvi pôr em prática tudo o que tinha pensado antes. E à medida que eu ia executando uma coisa, ia surgindo outra na minha cabeça."
Quando a amiga Heloísa Lustosa foi visitá-la em Paris, em 1999, Sonia abriu os primeiros desenhos da série Eu sobre uma mesa. Há algum tempo ela vinha utilizando a palavra "eu", traçada em letra miúda, para formar linhas, preencher espaços, produzir jogos de sombra e luz, compondo retratos, paisagens, animais. Agora, Sonia queria uma opinião da amiga. "Eu falei com convicção que ela tinha talento e que deveria sim trabalhar esse talento e continuar produzindo", lembra Heloísa Lustosa.
O elogio veio seguido de um convite: expor os desenhos no Museu Nacional de Belas Artes, do qual Heloísa era diretora. Proposta aceita, Sonia iniciou um período de grande criatividade, que não só resultaria nos 40 desenhos publicados no livro Eu, como na concretização de ideias que há tempos brincavam na sua mente irrequieta, como o Guarda-chuva morcego, que tinha patenteado em 1990; seios de borracha, que podiam realmente espirrar leite (ou uísque); uma colagem sobre o conflito no Oriente Médio; a árvore feita de letras, em grande formato, que mostrara no seu Livro da árvore; os poéticos rolos de papel higiênico de És tudo; a camiseta Nós, que vestia duas ou três pessoas.
Também faziam parte da mostra Se é para brincar eu também gosto livros como Baticum e O tempo no tempo, a caixa Diálogo e um quebra-cabeças impossível de montar. Sonia considerava como peça principal um homem feito em tricô de aço, pendurado em grandes agulhas, cujos testículos eram antigos porta-moedas de malha de metal. O tricô era um dos seus passatempos favoritos. O homem-eu existia também como desenho e era a estrela do vídeo Meu nome é eu, realizado em parceria com a jovem diretora Alice Andrade.
Luiz Camilo Osório assinou crítica em O Globo: "A despretensão é sua marca registrada, a começar pelo título da mostra (...). Tudo serve como suporte para sua criação poética; de uma câmara de vídeo até um prosaico rolo de papel higiênico. Simplicidade e humor estão por toda parte nesta exposição. O espectador sairá, certamente, mais leve da galeria, mesmo que saia, também, um pouco introspectivo."
Na abertura, um incidente divertido descrito pelo crítico: um painel da parede exibia os seios de borracha produzidos por Sonia. Um deles podia ser tocado pelo público por uma abertura. Depois de muitos apertões, o seio caiu no chão, exatamente no momento em que chegava o cirurgião plástico Ivo Pitanguy. O artista Artur Barrio, presente ao vernissage, não perdeu a tirada: "Pitanguy, você chegou na hora certa, o peito caiu!".